Mais de um milhão de pessoas por semana apresentam sinais de depressão, apego emocional ou pensamentos suicidas nas conversas com o chatbot.

  • Dethronatus Sapiens sp.@calckey.world
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    1 month ago

    @stochastic_parrot@sh.itjust.works @noticias@lemmy.eco.br

    Uma coisa que me incomoda, como alguém que já foi diagnosticado como tendo “depressão” e “pensamentos suicidas”, é a mecanicidade de respostas diante de terminologias suicidas, seja por LLMs e algoritmos ou até mesmo por pessoas: frases genéricas como “você não está sozinho”, “isso vai passar” e “ligue para o CVV”, por exemplo. Para quem cuja depressão emerge, dentre outros fatores, de uma percepção de como o mundo é enganoso, isso mais atrapalha que ajuda, pois é insincero.

    Não me leve a mal: por mais bem intencionados que voluntárixs do CVV e outras “linhas de prevenção ao suicídio” sejam, e são, o máximo que podem resolver são situações de crise que envolvam necessidade emocional de companhia, ainda que ilusória e temporária. Duvido que sejam todos os casos.

    Além disso, o óbvio precisa ser dito: voluntárixs não conhecem acolhidxs do outro lado da linha, não sabem contexto de vida, crenças e valores, nem sabem quais termos evitar que poderiam potencialmente engatilhar traumas. As respostas, portanto, só poderão ser superficiais, mais pra “engambelar” e evitar um ato de suicídio do que pra resolver o que causou tal pensamento. É uma dipirona, apenas para amenizar uma dor, mas longe de poder curar a causa subjacente.

    E o meu caso, longe de querer ser melhor que outrem, é ainda mais complexo. Nem mesmo o CAPS soube me “ajudar”: todas as vezes que passei por “acolhimento” saí mais frustrado que quando entrei, ouvi literalmente de psicóloga “estou com dificuldade em encontrar uma queixa em você” enquanto psiquiatras recentes disseram que preferiam não me medicar (não sei até que ponto é bom ou ruim, bom é que eu não fico dependente de produto farmacêutico), mas nenhum papo me ajudou.

    Motivo? É que o que tenho vai muito além de questões mundanas. Não são meras insatisfações profissionais, pessoais, familiares: não é (só) solidão, não é (só) desemprego, não são (só) traumas de infância por bullying escolar, são todo um conjunto de dilemas filosóficos e espirituais, sentimentos luciferiano e niilista de rebeldia e inconformismo com toda essa coisa de “existência humana”. Novamente, longe de mim querer ser superior, mas duvido que CVV vai saber dialogar sobre, por exemplo, arcontes e demiurgo, compliance social, determinismo e entropia cósmica, apenas pra citar alguns conceitos aleatórios de dentro da minha mente. Digo porque tentei conversar sobre coisas similares no CAPS e só saí frustrado.

    E quando ouço que apresento “perda da função social”, esse sentimento extrapola ainda mais: fica blatante o quanto nasce-se pra servitude. O imperativo é “ter função”, servir pra servir.

    Quando alguém, portanto, recorre a ChatGPTs, o problema muitas vezes está longe de ser solucionável por linhas de prevenção de crises, senão essa pessoa já estaria recorrendo a tais linhas. Então disclaimers genéricos “ligue pro CVV” é nada mais que isso: genérico como a dipirona genérica.

    Perdão pela sinceridade.